As investigações dos atentados da trágica sexta-feira, 13 de novembro, em Paris, revelaram uma Bélgica no centro da rede jihadista, mais precisamente no popular bairro de Molenbeek-Saint-Jean, com uma grande população islâmica. No domingo, 3 de dezembro, mais dois suspeitos foram presos, Samir Z, um francês, de 20 anos, e Pierre N, cidadão belga de 28 anos, ambos moradores de Molenbeek. Vivendo entre Paris e Bruxelas, a fotógrafa e jornalista Marina Sprogis conta como a população está reagindo à ameaça do terror.


Quando Bruxelas parou, todo mundo se assustou!!! Eu também levei o maior susto quando sábado, dia 21 de novembro, acordei ao som das sirenes da polícia e dos bombeiros e constatei que o meu paraíso belga estava em Guerra.

- Como assim? Aqui também?

Marina Sprogis


Há um ano vivo entre Paris e Bruxelas. Estava completamente traumatizada com os atentados de Paris naquela sexta feira 13 fatídica, me sentindo privilegiada por estar de volta a Bruxelas. Para mim, esse reino da paz estava desabando. Sem transportes públicos, comércios, escolas, com universidades, museus, cinemas e teatros fechados, o que fazer?

Na televisão, o primeiro ministro Charles Michel, com cara de enterro, declarando estado de emergência nível 4. Para quem não sabe, o nível 4 é o nível máximo. Guerra! A Grand Place vazia, ocupada pelo exército. Eu, que sempre ri dos europeus, que diante de qualquer ameaça de crise saem para as compras e se abastecem para 6 meses no mínimo com macarrão, café e açúcar, me lembrei de que minha geladeira estava literalmente vazia e de que poderia dar uma de faquir durante 48 horas no máximo. Socorro!

molenbeek

Esse espanto foi aumentando à medida em que os dias foram passando e o nível de alerta continuava 4. Aos poucos os metrôs foram parcialmente abertos dando uma certa mobilidade aos cidadãos. As escolas também abriram suas portas e receberam seus alunos de volta mas o alerta continuou. Sem falar no prejuízo econômico que essa situação acarretou com todos os centros comerciais e ruas completamente fechados. Penso também na imagem que vamos ter desse reino normalmente tão pacífico e seguro.

Bruxelas e o convívio de todas as nacionalidades

Bruxelas é a capital europeia, sede da Uniao Europeia e da OTAN. Nela todas as nacionalidades e religiões vivem harmoniosamente. Quando cheguei aqui me disseram que o dia em que eu não escutasse 5 línguas diferentes é porque tinha ficado trancada em casa. Realmente essa diversidade de nacionalidades e idiomas, essa aceitaçao tácita dos costumes e tradições de cada comunidade é um sinal da abertura de espírito belga.

Europeus se perguntam se abertura do país não facilitou terrorismo

Hoje, com essa situação de guerra, os outros europeus se perguntam se não foi isso que desencadeou o aumento dessa organização de fanáticos islâmicos. Agora é fácil colocar a culpa no país vizinho. Estamos bloqueados para provar que a prevenção é a melhor maneira de reagir agora e não permitir que esses loucos do Daesh (Estado Islâmico) façam novos atentados como os de Paris.

Belgitude: a atitude belga

Temos de dar tempo aos órgãos de segurança para voltarmos à paz. As fronteiras foram fechadas como antigamente, antes dos acordos de Schengen (que em 2 de outubro de 1997 abriu as fronteiras da União Europeia). Para entrar na Belgica precisamos mostrar documentos válidos e somos checados um a um. O bairro de Molenbeek e alguns outros aqui de Bruxelas, com uma grande população muçulmana, estão sendo literalmente vasculhados pela polícia.

Mas o que mais me impressiona e que ainda faz parte do meu aprendizado de belgitude (atitude belga) é que a população continua confiante, disciplinada e muito civilizada. Diferente dos franceses, que criticam sempre tudo o que o governo diz. Não posso esquecer que vivo em um reino e que meu conto de fadas continua, com guerra ou sem ela, se possível.
Vive la Belgique!


Marina Sprogis é fotógrafa e jornalista. Com sua câmera, é um dos olhares mais experientes e sensíveis nas semanas de moda em Paris.

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